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Janeiro vira termômetro emocional na gestão de pessoas das empresas

Prática cresceu com o aumento da preocupação com a saúde mental e sua relação com os indicadores de produtividade, engajamento e retenção

O início do ano passou a ocupar um papel estratégico na gestão de pessoas das empresas brasileiras. Mais do que marcar um recomeço simbólico, janeiro vem sendo utilizado como um período de leitura do estado emocional das equipes após o retorno das férias, funcionando como um ponto de ajuste das decisões tomadas no planejamento estratégico do ano anterior. A prática ganha força em um cenário no qual saúde mental deixou de ser apenas pauta de bem-estar e passou a impactar diretamente indicadores de produtividade, engajamento e retenção.

Para a especialista em saúde mental corporativa e fundadora da plataforma IntegraMente, a psicóloga e advogada Jéssica Palin Martins, o primeiro mês do ano não substitui o planejamento, tradicionalmente realizado no terceiro trimestre, mas permite avaliar se ele permanece funcional.

Com mais de 15 anos de atuação em comportamento organizacional, a especialista acompanha empresas que usam janeiro para observar como as pessoas retornam ao trabalho e onde surgem sinais de desgaste emocional. “O planejamento já foi feito. Janeiro é o momento de verificar se aquilo que foi desenhado continua coerente com a realidade emocional das equipes”, observa.

O contexto ajuda a explicar essa mudança de postura. Dados do relatório State of the Global Workplace 2023, da Gallup, mostram que apenas 23% dos profissionais no mundo se declaram engajados no trabalho. No Brasil, o desafio é ampliado pela alta rotatividade. Levantamento do Global Talent Trends Report, do LinkedIn em parceria com a PwC, indica que 56% dos desligamentos no país ocorrem por iniciativa do próprio colaborador, índice acima da média global.

Segundo especialistas, o retorno das férias funciona como um revelador de clima organizacional. Queda de engajamento, conflitos latentes e aumento do absenteísmo costumam se manifestar logo nas primeiras semanas do ano. “São sinais silenciosos que, quando ignorados, se transformam em problemas estruturais ao longo do ciclo”, explica Palin.

Na avaliação da psicóloga, o retorno das férias funciona como um revelador do clima organizacional. É nesse período que quedas de engajamento, conflitos latentes e aumento do absenteísmo tendem a se manifestar com mais clareza, logo nas primeiras semanas do ano. “São sinais silenciosos que, quando ignorados, se transformam em problemas estruturais ao longo do ciclo”, explica.

Alterações na legislação

O movimento também dialoga com mudanças regulatórias recentes. A Lei nº 14.831, sancionada em 2024, criou o Certificado de Empresa Promotora da Saúde Mental, enquanto a atualização da Norma Regulamentadora nº 1 passou a incluir oficialmente os fatores psicossociais no Gerenciamento de Riscos Ocupacionais. Na prática, a legislação reforça a necessidade de monitoramento contínuo do emocional nas organizações.

Plataformas especializadas em gestão emocional registram aumento na procura por diagnósticos no início do ano, especialmente por empresas que buscam reduzir riscos e orientar decisões de liderança com base em dados. “Gestão de pessoas não é só sobre processos, é sobre gente. Para cuidar bem das pessoas, é preciso entender como elas funcionam emocionalmente”, afirma.

Estudos da Deloitte reforçam a pressão por esse tipo de abordagem. Pesquisa global divulgada em 2024 aponta que 76% dos profissionais da geração Z consideram a saúde mental um critério decisivo na escolha de um emprego.

Com isso, janeiro passa a cumprir um papel técnico na gestão de pessoas, como um termômetro emocional das organizações, funcionando como um ponto de validação do planejamento e de leitura do clima organizacional. Ao observar indicadores emocionais logo no início do ciclo, empresas conseguem antecipar riscos, ajustar decisões e reduzir impactos que, ao longo do ano, costumam se traduzir em perda de engajamento, rotatividade e queda de desempenho.